Novembro e o movimento negro.
Saudemos Zumbi dos Palmares e todas as nossas referências.
O mês de novembro marca sem
dúvida um momento extremamente importante para
toda militância do movimento negro, em que pese as mudanças que já foram
implementas nas articulações diárias e que resultaram em conquistas
importantes, tais como o Estatuto da Igualdade Racial, muito embora algumas
forças políticas sempre se manifestaram contrária, alguns avanços são claros e
sentidos no seio da nossa sociedade.
Marca importante deste mês de
novembro e que merece muito destaque por nossa parte é a mais recente decisão
do STF, quando do julgamento das políticas de ação afirmativas, cotas, que
terminou por decidir que a constitucionalidade do programa de ações afirmativas
é válido e deve ser cumprido e principalmente reforçado por todos nós por sua continuidade, afinal, nossa luta histórica e que resultou na morte
de muitas lideranças em prol de tais ações não podem e não devem cessar.
Fatos como a validade
constitucional traz no seu bojo a mensagem de que as instituições, e
principalmente o judiciário não podem mais se curvar aos anseios e vontades de
determinados grupos hegemônicos que secularmente detiveram o poder em suas
mãos. Avaliar a política de ações afirmativas é na verdade processar com cuidado
a atenção devida para que possamos construir no cenário nacional ações que
fortaleçam estrategicamente nossos anseios mais simples.
A decisão do STF traz luz ao
debate que alguns grupos dominadores fizeram por décadas contra a promulgação
de um diploma que minimamente fizesse frente a esta política racista que o
Estado marcadamente praticou e assumiu por séculos. Quando pensamos em reparações, e estas não
podem ser convertidas em espécie, muito embora fosse algo natural, pois os anos
de trabalho escravo mereciam e merecem uma JUSTA indenização, nos “resta”
pensar em caminhos que possam nos fortalecer fazendo criar e difundir
expectativas positivas em nossa sociedade. Quando nos deparamos com negras e
negros que começam a entender a necessidade de se mostrar como tal, de entender
suas diferenças étnicas e a marcar posição com a cor da pele, podemos
afirmativamente dizer que o sentido do resgate de auto-estima e de identidade
étnica começa a se processar com efervescência.
Quando vemos e sentimos essa
negritude traduzidos nos rostos que formam a pluralidade do mosaico que
constitui nossa sociedade este sentimento de resgate podemos dizer que todo
sacrifício empenhado nos devolve emoção e recarrega nossas energias nos pondo
ávidos por continuar nesse processo com toda carga que nos cabe. Vale ressaltar que já não se admite mais
falar em supremacia de raças, até por que, segundo o professor Kabenguele Munanga,
uma das nossas maiores referências acadêmicas sobre o assunto, ao construir seu
artigo intitulado Conceito de Raça, Racismo e Raciologia, põe por terra a
supremacia construída com o fito único de diminuir quem não tivesse os padrões
eurocêntricos que formularam e disseminaram por décadas a idéia que o negro era
uma raça inferior e desprovida de inteligência e outros adjetivos mais. Com tal espírito é que o movimento negro
abriu-se a uma discussão que ia além de imaginar que só este grupo, sem o apoio
de outros atores pudesse inserir e propagar suas idéias e pensamentos sem o
comprometimento de outros grupos étnicos para que conosco, sem qualquer
prejuízo ou discriminação construir outro modelo social. Nesse sentido, pensar
negros, brancos, indígenas e todas as etnias convivendo numa sociedade mais
harmônica seria e se faz necessário e essencial. A retomada das revoltas,
insurreições neste momento dá-se pelo campo do conhecimento, no campo
científico-catedratico, pois começamos alcançar espaços na academia que nos
possibilita uma profusão de documentos, livros e artigos posto por nós na roda
da sociedade educacional, permitindo assim uma mudança de paradigmas. E eis que
aí está a política de ação afirmativa quando falamos em cotas no sistema de
educação, na Universidade para todos, sem trocadilho.
Juridicamente podemos afirmar que
o efeito prático da decisão do STF traz uma nova conformação aos propósitos dos
que se dedicaram a construir uma idéia falsa sobre a necessidade de se ampliar
a discussão e o debate sobre tais políticas.
É óbvio que temos ainda um
caminho imenso a percorrer na luta por reparações e na busca por melhores
condições, e aqui digo em todos os sentidos. Ainda somos entre jovens os que
mais morrem, jovens negros; ainda somos os que ocupamos os piores postos no
mercado de trabalho, aqui reforço o problema vivenciado por mulheres negras;
ainda enfrentamos o ranço da discriminação com sua marca expoente,
principalmente quando nos debruçamos a análise de textos, estudos e documentos
que criaram a idéia da miscigenação mentirosa.
O Estatuto da Igualdade Racial
deve ser trazido para uma discussão ampla sistemática e acadêmica, pois assim
podemos ampliar o debate e esclarecer todos que ainda se batem contra, muitas
das vezes sem o conhecimento mínimo da
história e que a mídia faz questão de tirar do foco de debate de suas programações,
salvo em momentos específicos. O Estatuto deve ser entendido no ordenamento
jurídico como diploma essencial para fortalecer a transformação necessária,
neste sentido cabe aos membros do Ministério Público, da Magistratura, da Ordem
dos Advogados, enfim, dos operadores do direito e do judiciário como um todo
atuar incessantemente na difusão desse mecanismo como ferramenta essencial para
transformação.
O mês de novembro deve significar
para todo militante do movimento negro e dos que o apóiam, um momento de
reflexão, principalmente quando não conseguimos ainda criar estratégias comuns
que possamos desenvolver para fazer frente aos graves problemas que ainda
vivenciamos no nosso cotidiano. Um movimento intenso só será capaz com uma
unidade de ação na luta e pela causa que comungamos, colocando de lado algumas
posições que por ventura não consensuamos. Assim como a luta contra o poder que
se iniciou lá atrás com o movimento campezino e com a social democracia,
podemos e devemos pensar políticas articuladas no sentido de unir forças contra
o que realmente precisamos estabelecer. Tais ações precisam necessariamente ser
construídas e reconstruídas com determinação e dedicação para que nossas ações
se fortaleçam tonifiquem da forma que esperamos.
Assim, nos cabe enquanto Conselho
estadual, estimular, propor e operacionalizar mecanismos de superação do
“racismo” e um amplo entendimento das entidades e partes envolvidas.
Desejo que o mês de novembro possa
continuar resignificando os avanços que temos construído ao longo dos tempos e
mantendo firme tudo aquilo que aprendemos com nossas lideranças. Aos nossos
mais velhos nossas homenagens.
Por Zumbi, por nossa história e
por tudo que este acúmulo significa. Asé.
José E. Ribeiro
Pres em exercício do CEPA
Conselho Estadual das Populações
Afrodescendetes de Santa Catarina
Aos companheiros e companheiras
militantes do Movimento Negro de Porto Alegre, nos do Conselho Estadual das
Populações Afrodescendentes de Santa Catarina, vimos pelo presente hipotecar
nosso apoio ao PL que tramita na Assembléia legislativa com finalidade de
instituir o programa de ações afirmativas (cotas) no mercado de trabalho.
Prescreve o art. 39 do Estatuto da Igualdade Racial prescreve: “ O poder
público promovera ações que assegurem a igualdade de oportunidades no mercado
de trabalho para a população negra, inclusive mediante a implementação de
medidas visando á promoção da igualdade nas contratações do setor público e o
incentivo à adoção de medidas similares nas empresas e organizações privas”.
Diz ainda o § 2º do novel codex, as ações visando a promover a igualdade de
oportunidades na esfera da administração pública far-se-ão por meio de normas
estabelecidas ou a serem estabelecidas em legislação específica e em seus
regulamento.
Com base nisso, cremos que essa
Casa de leis não se furtará a assumir seu compromisso constitucional/social que
é trazer aos administrados a proteção que lhes é devida pelo estado. Assim,
confiante de que o referido projeto terá seu trâmite como proposto,
apresentamos aos nobres deputados, nossos votos de estima e consideração.
A propositura do projeto marca
novo tempo no trato com as questões étnicorraciais e merecem o compromisso e
comprometimento dessa Casa, fato que pro si só nos mostra o quão elevado é o
espírito democrático republicado de Vossas Excelências.
Aos militantes do movimento, e em
especial ao companheiro José Antonio dos Santos, nossa fonte de informação meus
votos de estima e consideração. Precisamos de um movimento negro cada vez mais
em movimento.
Minhas saudações
Sem mais,
Atenciosamente.
José E. Ribeiro
Presidente em exercício
Conselho Estadual das Populações
Afrodescentes de Santa Catarina
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